por Basílio Machado
“Poetas, seresteiros, namorados, correio, é chegada a hora…”. Estava sorvendo a mítica canção do álbum “Louvação” (1967) de Gilberto Gil, consagrada na voz de Elis Regina, quando recebo de um amigo a informação de que o Café Mourad’s vai reabrir. Localizado no coração de Cachoeiro, o café foi durante anos um local onde se respirava e se conspirava política e os assuntos mundanos da cidade.
A alcunha “Boca Maldita” veio de herança de outras bocas que um dia permearam aquela vizinhança, como o Bar Vitória, a choperia Alasca e o inesquecível Pelicano, onde a jogatina, a fumaça dos cigarros e das cigarrilhas e o ardor inebriante do álcool subiam às narinas mais cabeludas e célebres da capital secreta. Época de política sem frescura, feita de culhões bravios de gente como Abel Santana, Raimundo Andrade, Dirceu Cardoso, Hélio Carlos, Doutor Gilson e por aí vai.
Agora os tempos mudaram. A presença feminina trouxe mais perfume à vida política. Culhões bravios dividem espaço com o veludo escarlate. Melhor assim. O fato é que, ao tomar conhecimento, procurei me certificar de que o tradicional café iria realmente reabrir e deixar desnuda aquela porta corrediça que faz ver por baixo as saias do Palácio Bernardino Monteiro. Porta que durante anos irritou prefeitos, malhou edis e atraiu toda sorte de privilégio e sacrilégio.
Ali no Mourad’s o destino do município já foi decidido. Isso eu vi, ninguém me contou. Partidos políticos trocaram sorrateiramente de mãos – o tombo do Kaiser – e jornalistas trocaram beijos e sopapos à luz do dia. Ao anoitecer, perdoaram e foram perdoados. Ali também a figura emblemática do Barbosa viveu seus dias de glória antes da merecida aposentadoria.
Naquela casa Higner Mansur, Rômulo Lousada, Ilton Machado, Tinoco Resende, Dejalmo Carvalho, Sérgio Neves, Antônio Herkenhoff e tantos outros articularam e desarticularam o universo político cachoeirano. Bons tempos que prometem voltar com outra roupagem, sob o comando do insuperável Cafifa. O Mourad’s volta mais simples no nome (só Mourad, sem o apóstrofo), mais charmoso e moderno. Para eles e elas. Que passe logo essa pandemia.